quarta-feira, 31 de maio de 2017

Se você observar bem, uma crônica acontece ao seu lado. Agora.

Por Conrad Pichler

Esse era o mote para mais uma prática de produção de texto do 8º ano: observar uma situação inusitada, que pudesse ser o “gatilho” para uma história. Gatilho é a situação que deflagra uma crônica narrativa, em suma, o que dá vontade de escrever (ainda que, para alguns autores, o gatilho mais eficiente seja o “deadline”). Depois de encontrar esse assunto, com um punhado de ficção recheada de verdade, os alunos escreveriam uma crônica que pudesse entusiasmar os leitores.




Mas toda a aproximação com este gênero começa bem antes; no início do trimestre, apresentamos aos alunos o livro As cem melhores crônicas brasileiras (Objetiva), organizado por Joaquim Ferreira dos Santos, um apanhado de textos que abrange autores do final do século XIX até autores do insipiente século XXI; de Machado de Assis a Luís Fernando Veríssimo. Eram cem crônicas. O nosso trabalho? Ler, ler e ler!

Nossa curiosidade girava em torno de conhecer como esses autores partiam ou perseguiam uma ideia, uma cena, uma história para construir seus textos, em poucos parágrafos. Logo a primeira constatação: tudo poderia ser matéria de crônicas, os acontecimentos da sociedade, o desencontro de gerações, os encontros de amigos, amores perdidos e achados… no fim, até mesmo a própria crônica e o cronista poderiam ser temas de crônicas.

A partir daí, entendemos que o cronista, o narrador e o autor são irmãos trigêmeos, mas de mães diferentes, ou melhor, de necessidades diferentes. O primeiro nasce de uma necessidade de registrar o tempo, aquele papel que escritores, poetas e jornalistas assumem de sentinelas de suas gerações (e antenas de seu povo); o segundo nasce da necessidade de dialogar com o leitor, a voz do texto que narra e comenta acontecimentos vividos ou inventados para o outro; o terceiro é uma figura misteriosa, às vezes parece-se com as outras duas, às vezes não, o que sabemos é que o autor escolhe os melhores recursos textuais à sua disposição para escrever seus textos.

E os textos das crônicas são muito variados, justamente porque há muitos estilos, muitas construções possíveis, muitos assuntos. O que observamos é que o a crônica, pouco a pouco, deixa seu papel de registrar os grandes acontecimentos do ponto de vista subjetivo e torna-se uma ferramenta poética para a poesia dos pequenos gestos, pensamentos, dos infinitamente minúsculos fenômenos... e, claro, uma ode ao bom humor, à sátira, à galhofa.

É dessa forma que a crônica se mantém jovem depois de séculos: rindo com o leitor e rindo de si mesma.

Assim reencontramos os alunos pesquisando um tema para suas produções, eles foram convidados à circular pela Livromania, no início de abril, para encontrar um gatilho. Para encontrar um motivo para escrever, mas sabe o que eles aprenderam de verdade? A vida, a poesia, não se revela facilmente. A frustração foi tema de alguns textos, mas também esta não é uma etapa significativa da vida e parte constante do cotidiano de todos nós? Então registramos essa e muitas emoções como memória, como história e como estória.