quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Entrevistar é mais do que perguntar

Por Rosana Nunes e Adriana Gallão

Sabemos que, nas entrevistas, o entrevistador faz perguntas a um entrevistado com o objetivo de obter informações, esclarecimentos ou opiniões sobre um determinado assunto, sendo a entrevista uma das metodologias aplicadas em trabalhos de pesquisa científica. É muito utilizada por amplo campo de pesquisas, em especial nas ciências sociais.

Para as crianças, entretanto, não é tão simples; por isso, antes de elaborarem perguntas, os alunos, com a ajuda do professor, se preparam reunindo informações sobre o assunto a ser abordado, para que aja maior interação entre o entrevistador e o entrevistado.

No Fundamental I, os alunos analisam entrevistas anteriormente publicadas em jornais e revistas, com o objetivo de perceber a sua estrutura: título, apresentação, perguntas e respostas.

 

Antes de elaborarem as perguntas, os alunos são convidados a trocar ideias, em duplas ou coletivamente, com a intenção de garantir perguntas pertinentes, sendo esta uma vivência muito potente e desafiante para aprenderem a organizar a forma de perguntar.

Outro desafio é o trabalho com a escuta - o entrevistador precisa estar atento às perguntas para conseguir fazer a regulação e, neste momento, os alunos ainda precisam da mediação do adulto, o que é esperado. Por isso, nos preocupamos mais em trabalhar algumas palavras que ajudam a antecipar o que será respondido: quem, quando, como, onde, por quê. Após compartilharem o que já sabem e o que ainda falta saber, elaboramos o roteiro para a entrevista, acrescentando novas sugestões para, então, realizarem a entrevista. 

Para os alunos do Ensino Médio, que já têm maior experiência, procuramos ampliar o uso das entrevistas como estratégia na busca de conhecimento. Ao propormos projetos de pesquisa, queremos desenvolver diferentes habilidades e competências necessárias para fazer descobertas e produção de conhecimentos. O processo de investigação e a comprovação de um determinado objeto de pesquisa requer mais do que a leitura de livros que trazem informações já construídas.

Professores e alunos aprendem juntos e compreendem que o processo de ensino e de aprendizagem se efetiva na construção ativa e participativa do conhecimento. Pesquisar é, portanto, um importante caminho para se chegar ao conhecimento. É na pesquisa que utilizamos diferentes instrumentos para se chegar a uma resposta mais precisa.

São muitas as estratégias de coleta de dados na pesquisa de campo. Em uma abordagem qualitativa, dentre elas, a entrevista ocupa lugar de destaque. Quando queremos conhecer a história pessoal é importante dar destaque à subjetividade, que fornece elementos que nenhuma outra fonte seria capaz de dar, pois pode revelar sentimentos, significados, simbolismos e, até, a imaginação das pessoas. A riqueza de uma pesquisa com esta metodologia está na importância atribuída às histórias vividas.

"O termo entrevista é construído a partir de duas palavras, entre e vista. Vista refere-se ao ato de ver, ter preocupação com algo. Entre indica a relação de lugar ou estado no espaço que separa duas pessoas ou coisas. Portanto, o termo entrevista refere-se ao ato de perceber realizado entre duas pessoas". RICHARDSON (1999) p 207.

A história oral passou a ser mais valorizada como método de pesquisa de campo na medida em que pesquisadores constataram que percepções, sentimentos, emoções, valores e visões de mundo não “apareciam” nos dados estatísticos. Assim, muitos pesquisadores começaram a incluir a entrevista como uma estratégia válida para buscar informações.

Segundo Gil (1999), as entrevistas podem ser classificadas em: informais, focalizadas, por pautas e formalizadas. O tipo de entrevista informal é o menos estruturado possível. A entrevista focalizada é tão livre quanto a anterior, porém, enfoca um tema bem específico. 

No caso da entrevista estruturada, ou formalizada, ela se desenvolve a partir de perguntas fixas, cuja ordem e redação permanecem para todos os entrevistados. Por possibilitar também o tratamento quantitativo dos dados, este tipo de entrevista torna-se o mais adequado para o desenvolvimento de levantamentos sociais.

Em nosso projeto de pesquisa sobre os Movimentos da Humanidade no espaço e no tempo: Imigrantes e Refugiados, os alunos do Ensino Médio realizaram uma série de pesquisas com enfoque nos refugiados que estão agora no Brasil.

Após lermos diferentes textos e documentos, assistirmos a documentários e coletarmos informações em órgãos oficiais como ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados) e CONARE (Comitê Nacional para os Refugiados), decidimos aprofundar nossos estudos sobre os refugiados em maior quantidade no Brasil e São Paulo: os sírios e congoleses. Além desses dois grupos, incluímos no estudo os haitianos que, embora não sejam considerados refugiados pela legislação, são uma comunidade significativa em São Paulo. 

Para isso, os alunos de todo o Ensino Médio tiveram a opção de se inscrever em um dos três diferentes grupos de estudo, de acordo com seu interesse, para aprofundar seus conhecimentos. Entre outras atividades e metodologias de pesquisa, adotamos a entrevista como uma forma importante de saber mais sobre as causas que motivaram a saída dos seus países de origem, a escolha do Brasil como destino e, principalmente, perguntar como são recebidos pelos brasileiros. 

Tínhamos uma hipótese inicial, baseados no senso comum e em relatos de refugiados que nos visitaram e fizeram palestras, de que os brasileiros são muito receptivos e cordiais com os estrangeiros. Porém, essa receptividade só é oferecida aos brancos e aos que trazem investimentos. Já os refugiados negros e pobres, mesmo sendo capacitados profissionalmente, sofrem com o racismo e o preconceito.

Organizamos um roteiro de entrevista com a intenção de perguntar, ao maior número de refugiados, se nossa hipótese se comprovaria e também para conhecer as emoções, expectativas e sentimentos dessas pessoas que passaram por uma mudança de vida tão significativa e impactante. 

Visitamos, entre outros lugares, a Missão da Paz e Casa do Migrante, na Liberdade. Hoje, 90% dos acolhidos ali são imigrantes e/ou solicitantes de refúgio.



Os resultados dessas entrevistas e tantas outras reflexões e estudos sobre o tema serão apresentados na nossa Exposição anual.

Esperamos por vocês!

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