quarta-feira, 15 de abril de 2015

Quem canta seus males espanta - Mais uma edição comemorativa

Por Theodora Maria Mendes de Almeida – Diretora Pedagógica

Reunir o repertório de músicas e parlendas que faziam parte do nosso dia a dia na escola em um livro/ CD foi a forma que encontrei para registrar e valorizar ainda mais este patrimônio que faz parte de nossa cultura.

A maioria destas cantigas é acompanhada de movimentos e formas de brincar que, assim como as letras, variam segundo cada lugar deste nosso imenso país.  Foram trazidas por outros povos, como os portugueses, os africanos e tantos outros, sendo incorporadas e transmitidas a cada nova geração.

Cantar, dançar e desenhar já fazia parte da rotina de atividades das crianças na escola, o que dava a elas muito prazer, além de favorecer a ampliação de seus conhecimentos.

Escolhemos as ilustrações mais representativas de cada aluno, valorizando sua colaboração e sua percepção sobre o conteúdo das músicas e parlendas.
As gravações em um estúdio de verdade proporcionaram a todos uma experiência interessante e estimulante, além da compreensão de que a participação de cada um ficaria gravada não só na memória.

Para realizar este trabalho, procurei a parceria da Editora Caramelo, que se empenhou em produzir um livro de qualidade e garantir sua distribuição.  Assim, poderíamos compartilhar tudo isto com mais pessoas.
Em agosto de 1998, o livro/CD ficou pronto e fizemos uma grande festa para o lançamento.


O resultado foi, para todos nós, motivo de muito orgulho e satisfação, certos de que havíamos produzido algo importante.

Depois disso, fui me surpreendendo a cada dia com as manifestações de carinho de pessoas conhecidas e desconhecidas que, através de  cartas, e-mails e telefonemas, manifestaram seu encanto: professores, educadores, fonoaudiólogos, pessoas que realizam trabalhos importantes com crianças no nosso país, ou simplesmente pais, avós, tios, que se lembraram de momentos de sua vida de criança.  
Fomos presenteados com uma crônica, no jornal O Estado de São Paulo, do escritor Ignácio de Loyola Brandão, que mesmo sem nos conhecer compreendeu o valor de nossa proposta.

 

Em 2008 comemoramos os 10 anos de sucesso do volume 1 e em 2013  ganhamos um selo comemorativo.


Embora o número de músicas e parlendas tivesse sido grande, muitas outras ficaram de fora, pois há ainda um vasto repertório a ser explorado.  Todas estas pessoas começaram a nos sugerir uma segunda seleção, um segundo volume.

Começamos, então, a reunir outras tantas, incluindo agora também trava-línguas e adivinhas, tão instigantes e atraentes para as crianças.


Terminamos a escolha do repertório e das ilustrações das crianças em junho de 2000 e iniciamos em agosto as gravações no estúdio.  Para alguns de nossos alunos, era uma experiência já conhecida e, para outros, foi uma novidade cheia de expectativas.

Contamos  com a colaboração de alguns pais-músicos que gentilmente se ofereceram para participar, o que sem dúvida contribuiu para aumentar a qualidade e o prazer em ouvir.


Agradecemos a todos os que participaram: aos nossos alunos, que são a razão de nosso empenho, aos professores, que fizeram tudo acontecer, e aos pais, que confiaram em nosso trabalho e permitiram que seus filhos fizessem parte dele.

Para completar esta publicação, pedi a  Ignácio de Loyola Brandão que fizesse o prefácio e ele nos presenteou com mais um lindo texto:

O  resgate da magia

“Não existiam videogames, brinquedos comandados por controles remotos, nem sequer se cogitava na imensa parafernália eletrônica que a criançada tem hoje à disposição.  Pensar que uma bola de futebol de couro verdadeiro (capotão, dizia-se) era inacessível.  As lojas de brinquedos, se vistas hoje, pareceriam negócios em liquidação, em vias de fechar as portas, tão poucas as variedades.  Não reclamo, não tenho saudades, não critico.  Constato.  Cada época é sua época.  Hoje existem muitas opções, porém menos tempo para usufruir tudo, o que acirra a necessidade imediata de decisões.  Em outras épocas, o brinquedo ganho era o único que se teria por longo tempo, portanto era brincando até o desgaste total ou eventual troca.

Nesse mundo, a imaginação encontrou campo fértil.  Brincadeiras tinham de ser inventadas, criadas na hora, muitos jogos nasceram nas ruas em momentos de inspiração.  Para alimentar esses jogos existiam as cantigas de roda, os trava-línguas e as adivinhações.  De contrapeso as parlendas.  A agilidade mental era requerida, o raciocínio exigido.  Gerações cresceram respondendo perguntas do tipo: “ o que é, o que é/ uma caixinha de bom parecer/ que nenhum carpinteiro pode fazer?”  A primeira vez que ouvi, não entendi o que significava bom parecer.  Hoje, a frase seria: uma caixinha com um belo design e a resposta é amendoim.  O que cai em pé e corre deitado?  A chuva.  O que só pode ser usado se for quebrado?  O ovo.

Cada geração teve seus clássicos nas adivinhações e cantigas.  Algumas permanecem eternas.  O que me intriga, tanto quanto me intrigam as anedotas, é a questão da criação.  Quem, em que momento, senta-se e desenvolve uma piada, uma canção simples, uma adivinhação, um trava-língua?   Desenvolve pelo prazer que a criação traz, porque sabe que ela será anônima, de domínio público, não renderá direitos autorais.  É criação pura, em seu estado mais límpido, nascida de uma necessidade interior.

Cantigas, parlendas e adivinhações exigem extrema síntese e uma estrutura que encerra em si a intriga de um romance policial.  Em quatro linhas você obriga a pensar, a colocar os neurônios em atividade, a comparar.  Sabe que existe ali uma pegadinha (para usar um termo moderno)  e que a resposta óbvia não é a resposta certa.

Gênios anônimos por décadas (ou séculos) colocaram em campo uma produção extensa, divertida, o que nos divertiu.  E tudo estaria a se perder porque somos um país com pouca memória e um interesse menor ainda por ela, se as pessoas como Theodora Maria Mendes de Almeida não se colocassem em campo para recuperar tesouros (palavra antiga).  Este é o segundo volume de uma série que pode ser infindável e deve ser mantida até o momento em que se diga: não existe mais nada para ser recuperado.  No entanto, engana-se quem pensa que essa criação desapareceu.  Ela prossegue, talvez com menos intensidade, mas está viva, ainda que as crianças, nas noites de verão, não se reúnam mais na calçada para brincar de dar um tapa na bunda e ir se esconder, de atravessar a rua num pé só, de dançar a roda ao som de senhora Dona Sanja, de um homem bateu em minha porta, de Maria, sacode a saia, de tique-taque, carambola, este dentro, este fora.

No entanto, alguma coisa boa acontece.  Dei o primeiro volume desta coleção para duas sobrinhas de quatro anos e os CDs foram tocados à exaustão, para desespero das mães.  Desespero e alegria, porque eram coisas “do tempo delas”, renascidas nas filhas.  E os livros estão guardados para quando elas souberem ler.  As meninas crescem e cantam as músicas, elas se incorporam aos repertórios.  Quer dizer, a magia continua.  Felizmente pode continuar graças ao trabalho de Theodora.  Quero dizer, ainda, que não podemos, nem devemos, pensar nas crianças e adolescentes como uma geração tecnocrata, automatizada, eletronizada.  Fosse assim, por que o sucesso mundial, sem precedentes, de Harry Potter?  Porque lida com a magia e essa está dentro do ser humano.  E as criações populares resgatadas neste livro são pura magia, diversão.  Portanto, livro para ser adotado em escolas para ajudar as cabeças.  Livro de currículo, de adoção.  E sendo adotado, seria dos poucos lidos e ouvidos não por obrigação e sim por prazer.”


Este ano comemoraremos os 15 anos de lançamento do livro 2 na nossa LIVROMANIA.

Vivian Catenacci e Adriano Nunes farão uma apresentação especial do repertório  – voz, violão e percussão. 

LIVROMANIA – 25 DE ABRIL DE 2015
DAS 13h30 ÀS 18h

Um comentário:

  1. Que possamos passar essa cultura para muitas gerações!!!
    Parabéns, Tica!
    Rosana

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